Mercado imobiliário não está preparado para a reforma tributária, afirma
Por: Ana Paula Branco
Fonte: Folha de S. Paulo
O setor imobiliário e da construção civil está em alerta vermelho com a
proximidade da implementação da reforma tributária sobre o consumo.
Embora as novas regras entrem em plena vigência apenas em 2027, a fase de
testes já começa em 2026 —e executivos admitem que o setor ainda está longe
de preparado para a nova legislação. A dura avaliação veio de lideranças setoriais
durante o evento Incorpora 2025, evento da Abrainc (Associação Brasileira de
Incorporadoras Imobiliárias) para o setor imobiliário.
Ely Wertheim, presidente executivo do Secovi-SP, afirmou que "os empresários
do setor imobiliário ainda não perceberam a dificuldade que será se adaptar às
regras da reforma tributária". Ele foi enfático ao orientar os empresários
presentes ao evento : "quem não procurou seu contador ainda, procure".
O tom de urgência dominou o debate do último painel do evento, que contou
ainda com a presença de Luiz França, presidente da Abrainc, York Stefan,
presidente do Sinduscon-SP, Giovana Brunetta, gestora tributária sênior da
Grant Thornton, e Rodrigo Dias, advogado tributarista e sócio fundador do
VBD Advogados. A falta de preparo, avaliaram em consenso, pode custar caro
a agentes do setor.
Lucas Freitas, head de ofertas do segmento de construção da TOTVS, disse que
o cronograma de adequação das empresas já está atrasado. "Era para ontem.
Além de aumento de custo, a gente pode ter uma visão de prejuízo muito grande
a curto prazo já", afirmou.
Segundo os especialistas, a urgência na adaptação se dá não apenas pela
mudança estrutural, mas pela quantidade de questões pendentes, como
aplicação e operacionalização do redutor de ajuste.
A reforma tributária, que cria o IVA (Imposto sobre Valor Agregado) ao
consolidar tributos como PIS, COFINS, ICMS e ISS, é vista como necessária
para um setor com um sistema "completamente cumulativo". No entanto, a
transição é considerada altamente complexa.
A complexidade não se restringe apenas às grandes incorporadoras. O setor
demonstra um temor profundo sobre a adaptação dos elos mais frágeis da
cadeia. Giovana afirmou que a negociação de preços precisa nascer na análise
da cadeia de suprimentos.
"Ali é que vai nascer a negociação, que vai nascer o possível crédito, o aumento
do custo, que vai refletir diretamente no seu custo de produção e
consequentemente de venda", disse a executiva.
Com o novo sistema não cumulativo, o setor precisará renegociar com
fornecedores, incluindo aqueles do Simples Nacional, que podem ter que
aumentar sua alíquota e não contribuir para o crédito da incorporadora.
York Stefan, presidente do Sinduscon-SP, levanta outra questão: "se a nossa
cadeia de construção não está preparada, imagine o empreiteiro de mão de
obra?". O pequeno empreiteiro, fundamental para o ciclo da construção, terá
que optar por um regime tributário e pode se tornar menos atrativo para o
mercado se não contribuir com a base de crédito da empresa. Ele diz que será
preciso "aculturar" esses fornecedores para evitar gargalos.
Freitas fez ainda outro alerta: as empresas de tecnologia, como a TOTVS, terão
que adaptar sistemas para acomodar as novas informações. Se as empresas
deixarem a adaptação para o final do ano, "isso pode virar um problema", pois
o mercado não terá mão de obra especializada suficiente.
Apesar das dificuldades, a reforma também abre espaço para ganhos de
produtividade. Ao desonerar obras públicas e projetos habitacionais —como
os do Minha Casa, Minha Vida—, a expectativa é que a nova legislação estimule
a industrialização da construção civil, reduzindo entraves ao uso de prémoldados
e terceirizações.
York Stefan, no entanto, avalia que as prefeituras "definitivamente não estão
preparadas" para absorver esse movimento. Ele cita restrições urbanas, como
limitações ao uso de guindastes (gruas), que travam a adoção de técnicas
construtivas mais eficientes.
Apesar do temor com o curtíssimo prazo, França diz que "quem passar pela
arrebentação, vai sair ganhando com a reforma tributária".
A transição, porém, tende a ser custosa. A fase de testes com alíquotas fixas
começa em 2026 e se estenderá até 2032. Até lá, empresas terão de operar
sistemas paralelos, o que deve elevar o custo de gestão tributária no curto prazo.